sábado, 25 de março de 2017

RECOLHIMENTO DO FGTS DE TRABALHADOR DOMÉSTICO

O recolhimento do FGTS de trabalhador doméstico somente passou a ser obrigatório a partir de outubro de 2015, quando foi regulamentado o direito previsto na Lei Complementar nº 150/2015. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT10) acolheu o recurso de um empregador contra decisão que o havia condenado a recolher o Fundo de Garantia de junho a outubro de 2010, período não anotado na carteira de trabalho do empregado.
No recurso, o empregador alegou que, à época, o recolhimento de FGTS não era obrigatório para trabalhadores domésticos. Conforme informações dos autos, a empregada desempenhava a função de cuidadora de idosos. Em seu voto, o relator do processo na Terceira Turma, desembargador Ricardo Alencar Machado sustentou que “o simples fato de o empregador doméstico ter recolhido espontaneamente o FGTS a partir de novembro de 2010 não o obriga a fazê-lo em período facultativo anterior”.
Para o magistrado, o artigo 21 da LC nº 150/15, em seu parágrafo único, determinou que o empregador doméstico somente passaria a ter obrigação de promover a inscrição e de efetuar os recolhimentos referentes ao empregado doméstico após a entrada em vigor da regulamentação da lei. Com isso, “empresto provimento ao patronal para abolir a condenação em depósitos do FGTS”, conclui o relator.
(Flávia Corrêa)
Processo nº 0001057-97.2015.5.10.0010
Nota CPC:
Decreto nº 3.361, de 10/02/2000, cuja eficácia vigorou até o dia 30/09/2015:
Art. 1º O empregado doméstico poderá ser incluído no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, de que trata a Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990, mediante requerimento do empregador, a partir da competência março do ano 2000.
§ 1º Para efeito deste Decreto, o requerimento consistirá na apresentação da guia de recolhimento do FGTS, devidamente preenchida e assinada pelo empregador, na Caixa Econômica Federal - CEF ou na rede arrecadadora a ela conveniada.
§ 2º Efetivado o primeiro depósito na conta vinculada, o empregado doméstico será automaticamente incluído no FGTS.
Art. 2º A inclusão do empregado doméstico no FGTS é irretratável com relação ao respectivo vínculo contratual e sujeita o empregador às obrigações e penalidades previstas na Lei nº 8.036, de 1990.
Fonte: TRT 10ª Região: C.T.A. - Núcleo de Comunicação Social (Nucom) , publicada originalmente em 22/03/2017.
Abraços...

sexta-feira, 24 de março de 2017

DIREITO DO TRABALHO. DIREITOS DA MULHER

Em uma sociedade de base patriarcal como a nossa, as mulheres, ainda hoje, sofrem discriminação nos mais diversos campos: político, social e profissional. A revolução industrial ocorrida nos séculos XVIII/XIX trouxe a mecanização das fábricas e, com isso, a redução da necessidade da força física para o desempenho das funções, possibilitando a abertura do campo de trabalho às mulheres. Mas elas eram contratadas com salários bem menores que os dos homens e ainda tinham que suportar preconceitos e humilhações quanto ao seu desempenho profissional. Sem qualquer proteção legislativa, submetidas a jornadas exaustivas e sob condições prejudiciais à saúde, eram sujeitas aos mais diversos tipos de abuso em troca de seu emprego. Elas trabalhavam arduamente e ainda tinham que adequar seu trabalho às necessidades domésticas, já que os cuidados com a casa, o marido e os filhos eram tidos como obrigações femininas, gerando a chamada "dupla jornada" da mulher.
Após muita luta e resistência, aos poucos, foram surgindo mudanças no comportamento social e, com isso, algumas leis de proteção ao trabalho da mulher, para que o preconceito e a discriminação dessem lugar ao respeito e à valorização. No Brasil, com a promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT, em 1943, tivemos grande avanço na edição de normas de proteção à mulher trabalhadora. A CLT, em um capítulo inteiramente destinado às mulheres (Título III, capítulo III), estabelece diversas regras, visando inseri-las no mercado de trabalho, protegê-las do preconceito e da discriminação, além de garantir a elas condições especiais de trabalho, tendo em vista as características próprias da mulher, suas indiscutíveis diferenças físicas e psíquicas em relação ao homem. Muitas dessas normas são direcionadas à proteção da exclusiva e bela "tarefa" das mulheres: a de gerar a vida.
A Constituição da República de 1988, muito mais jovem que a CLT, reconheceu, em seu artigo 5º, a igualdade de direitos e obrigações entre homem e mulher. Mas, ao contrário do que pensam alguns, isso não levou à exclusão ou revogação das normas que conferem tratamento diferenciado ao trabalho das mulheres. O ideal da igualdade não se resume em "tratar igualmente os iguais", mas sobretudo, no tratamento "desigual aos desiguais". Assim, as normas exclusivas de proteção ao trabalho da mulher são a concretização do princípio da igualdade, procurando nada mais do que compensar as diferenças existentes entre os gêneros, diante dos fatores orgânicos, biológicos e sociais que diferenciam a mulher e o homem.
Em relação à proteção à maternidade, as medidas legais têm um objetivo de caráter social, tendo em vista que ao se proteger a mãe e mulher trabalhadora, preserva-se também o recém-nascido e a família, com repercussões positivas em toda a sociedade.
Nessa NJ especial, faremos uma breve exposição dos mais importantes direitos conquistados pelas mulheres na legislação brasileira relativos à maternidade. Numa próxima matéria, falaremos sobre as outras normas especiais que buscam proteger o trabalho da mulher.
Principais direitos assegurados à gestante
No Brasil, entre direitos previstos para a mãe que trabalha, podemos citar, como principais: 1. garantia de emprego a contar da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, inciso II, alínea b do ADCT); 2. licença maternidade de 120 dias, sem prejuízo do salário (art. 392 da CLT); dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e outros exames complementares (§ 4º, inciso II do art. 392 da CLT); intervalos para a amamentação, até que a criança complete 6 meses de idade (art. 396 da CLT); licença para levar o filho ao médico (art. 473, XI da CLT).
Garantia do emprego da gestante
A estabilidade da gestante está prevista no art. 10, inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988, que dispõe sobre a proibição de dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Caso a norma seja descumprida pelo empregador, a empregada terá direito à reintegração no emprego, ou a receber os salários do período da estabilidade.
É necessário esclarecer que a estabilidade se inicia com a gravidez da empregada, comprovada pelo exame médico ou laboratorial, e não da comunicação do fato ao empregador, entendimento já pacificado no Tribunal Superior do Trabalho.
A garantia ou estabilidade provisória da gestante representa uma grande conquista das mulheres, porque seria pouco provável que, nesse período de gestação, ela conseguisse ser contratada por outro empregador. Além disso, a garantia de permanência no emprego até 5 meses após o parto concede à mãe um tempo razoável para se recuperar do parto e, sobretudo, para cuidar da criança nos seus primeiros meses de vida.
É importante lembrar que o artigo 391 da CLT dispõe que casar ou engravidar não configuram motivo para rescisão contratual ou restrições ao direito da mulher ao emprego. Se isso acontecer, o empregador terá que pagar multas que lhe serão aplicadas pela autoridade do Ministério do Trabalho. O dispositivo busca evitar a discriminação da mulher no mercado de trabalho em razão da maternidade.
Licença maternidade e salário-maternidade
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, XVIII, assim como a CLT, eu seu art. 392, asseguram à gestante uma licença-maternidade de 120 dias, sem prejuízo do emprego e do salário no período. O afastamento, no caso, é obrigatório e o contrato de trabalho é interrompido. A empregada deve, mediante atestado médico, notificar o seu empregador da data do início do afastamento do emprego, que poderá ocorrer entre o 28º dia antes do parto e a ocorrência deste.
No período da licença, a gestante tem direito a receber os salários integrais, constituindo o que se denomina "salário-maternidade", benefício de natureza previdenciária, regulamentado pela Lei n.º 8.213/91 e pelo Decreto 3.048/1999.
Possibilidade de ampliação do período de licença maternidade
A partir da Lei 1.770/08, é possível às empresas privadas aderir, a seu critério, ao programa "Empresa Cidadã". Nesses casos, as empregadas terão direito de prorrogar a licença maternidade por 60 dias, quando receberão os salários da própria empresa que, em troca, poderá deduzir o valor integralmente no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.
A licença de seis meses (180 dias) atendeu a recomendações médicas e a uma reivindicação antiga de diversas entidades de classe e movimentos sociais. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a mãe deve amamentar o bebê por, no mínimo, seis meses.
A mãe adotiva
A licença à maternidade e o salário maternidade foram estendidos para a mãe adotiva e para a pessoa que obtém a guarda judicial de uma criança pela lei 10.421, de 15/04/2002, que acrescentou o artigo 392-A da CLT. Nesses casos, a licença-maternidade só será concedida com a apresentação do termo judicial de guarda à adotante ou à guardiã. O fundamento é que a chegada da criança adotada em sua nova casa é equiparada ao parto, já que a mulher também vai se ocupar cuidando da criança que chegou, dando-lhe atenção, neste período de adaptação.
Essa lei previa períodos diferenciados de licença-maternidade à adotante ou guardiã, de acordo com a idade da criança. Entretanto, a Lei 12.010/2009 acabou com essa diferença, revogando os parágrafos 1º, 2º, 3º do art. 392-A da CLT que previam essa distinção. Com a nova lei 12.010/2009, o período da licença à maternidade vai ser de 120 dias, independente da idade da criança, ou 180 dias nos casos do programa empresa cidadã, considerando como criança, pessoa com até 12 anos de idade incompletos, segundo o art. 2º da Lei 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Na verdade, a distinção não se justifica, pois todos sabem que quanto mais velha a criança maior é a sua dificuldade de adaptação ao seio familiar.
Adoção monoparental
A família monoparental pode dar a base certa, a referência estável, que uma criança necessita, do mesmo jeito que uma família tradicional. A adoção monoparental é a mais comum, sendo realizada por pessoas solteiras, viúvas, separadas ou divorciadas.
A mulher que adota não encontra problemas para obter a licença e o salário maternidade, mas os homens enfrentam obstáculos. A Lei nº 10.421/02, que acrescentou o art. 392-A à CLT, fala sempre no feminino, como seguradas e empregadas, deixando dúvidas a esse respeito. Mas a doutrina e jurisprudência tem apontado no sentido de que deve prevalecer o princípio da igualdade, onde todos são iguais perante a lei, sem distinção entre homens e mulheres. Se a mulher que adota uma criança tem o direito de receber a licença e o salário maternidade, este direito também deve ser reconhecido ao homem que adotar, afinal, as necessidades e dificuldades serão iguais para ambos. Além disso, a finalidade dos benefícios é a convivência e o estreitamento da relação, dos laços entre adotante e adotado.
Hoje em dia, o homem possui o direito de se ausentar apenas 5 dias, no que diz respeito a licença à paternidade, conforme consta na Constituição Federal de 1988, em seu art. 7, XIX, e no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em seu art. 10, § 1º. Este período será contado a partir da data do nascimento da criança, conforme art. 473, III da CLT. Para os empregados de empresas que integrarem o Programa Empresa Cidadã, a licença paternidade será prorrogada por mais 15 dias, conforme previsto na Lei 11.770/2008, com a redação da Lei 13.257/2016.
Adoção por casal homoafetivo
O casal homoafetivo deve possuir os mesmos direitos de um casal composto por homem e mulher. Aqui, mais uma vez, tem aplicação o tão consagrado e importante princípio da igualdade, previsto no artigo 5º da Constituição Federal de 1988 que diz que: "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza".
Assim, é evidente que o casal homoafetivo também tem o direito de adotar uma criança, possuindo a mesma capacidade de criar, educar e amar. Nesse caso, como não poderia deixar de ser, também existe o direito à licença-maternidade e ao salário maternidade previsto para o adotante, independentemente do fato de o casal homoafetivo ser formado por homens ou por mulheres.
O que mudou para as domésticas
A Constituição de 1988 conferiu aos empregados domésticos a "licença-maternidade de 120 dias, e seu salário e emprego de volta, dentre outros benefícios". Entretanto, o artigo 7º não incluiu no rol de direitos da empregada doméstica a garantia de emprego em caso de gravidez, o que gerou posicionamentos divergentes em relação a aplicação deste direito às domésticas. Foi a Lei nº 11.324, de 19 de julho de 2006, que trouxe a estabilidade à empregada doméstica gestante, nos mesmos patamares concedidos às demais trabalhadoras.
Entretanto, em relação ao direito da doméstica à reintegração no emprego, quando desrespeitado a estabilidade da gestante, a matéria é tratada com cuidado. A doutrina e jurisprudência têm entendido que as circunstâncias especiais do trabalho doméstico, prestado na residência e no ambiente familiar do empregador, pode tornar desaconselhável a reintegração da empregada no emprego, obrigando o empregador somente ao pagamento dos salários que seriam devidos pelo período da estabilidade da gestante.
Direito de se ausentar para consultas médicas
A empregada gestante também poderá se ausentar do trabalho, sem prejuízo do salário e demais direitos, pelo tempo necessário para realizar, no mínimo, 6 (seis) consultas médicas e exames complementares (§ 4º, inciso II, do artigo 392 da CLT, com redação da pela Lei 9.766 de 26/05/1999).
Se necessário, o médico poderá ampliar o número de consultas e exames, concedendo-lhe licença médica. Nesse caso, os primeiros 15 dias de afastamento serão por conta do empregador, depois desse período, as despesas ficam a cargo do INSS, que pagará à gestante o auxílio-doença. As regras visam garantir que a mulher tenha o devido acompanhamento médico da gravidez e faça o pré-natal.
Falta ao serviço para acompanhar esposa grávida ou filho menor de 6 anos a consultas médicas
Em 9 de março de 2016 foi publicada a Lei 13.257, conhecida como o "Marco Regulatório da Primeira Infância". A nova lei visa estabelecer princípios e diretrizes para a formulação e a implementação de políticas públicas para menores de seis anos, em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento do ser humano.
Algumas dessas regras afetam diretamente a relação de trabalho da empregada gestante e mãe. Entre elas podemos citar o artigo 37, que acrescentou os incisos X e XI ao artigo 473 da CLT. O inciso X permite que o empregado deixe de comparecer ao serviço por até 2 dias, sem prejuízo do seu salário, para acompanhar sua mulher ou companheira em consultas médicas e exames complementares durante a gravidez. Já o inciso XI do mesmo artigo concede ao pai ou à mãe o direito de se ausentar do serviço por um dia ao ano para acompanhar filho de até seis anos de idade em consulta médica. Ambas as situações são tidas como novas hipóteses de faltas justificadas ao serviço.
Atividade prejudicial à gestação
O art. 394 da CLT fala que, nos casos em que o trabalho é prejudicial à gestação, a mulher pode pedir a rescisão do contrato de trabalho, ficando dispensada do aviso prévio.
O período de amamentação e auxílio-creche
O art. 396 da CLT concede à mulher dois descansos especiais, de meia hora cada um, para amamentar o filho, até que ele complete seis meses de vida. A Lei concede também uma dilatação desse prazo de seis meses, caso a saúde do filho exigir.
A legislação prevê, ainda, que as empresas que tiverem pelo menos 30 (trinta) mulheres empregadas, com mais de 16 (dezesseis) anos de idade, deverão possuir um local adequado (creche) para que elas possam deixar seus filhos durante o período de amamentação. (art. 389, §1º da CLT), podendo substituir o espaço pelo pagamento em dinheiro de auxílio-creche, se previsto em instrumento coletivo, ou mesmo por meio de creches distritais mantidas, diretamente ou mediante convênios, com outras entidades públicas ou privadas, pelas próprias empresas em regime comunitário, ou a cargo do SESI, do SESC, da LBA ou de entidades sindicais (art. 389, § 2º da CLT).
O aborto
O art. 395 da CLT trata especificamente do aborto e diz que nos casos em que o aborto não é criminoso, comprovado por atestado médico, a mulher tem direito a um repouso remunerado de duas semanas, ficando-lhe assegurado o direito de retornar à função que ocupava antes de seu afastamento.
A proibição de práticas discriminatórias
Já o artigo 391 da CLT proíbe que se utilize como justo motivo para rescisão do contrato de trabalho o fato da mulher ter contraído matrimônio ou de estar grávida. A mesma proibição prevalece para que o empregador use esses argumentos como critério para não contratação de mulheres.
Por seu turno, o artigo 373-A da CLT proíbe a exigência de atestado de gravidez ou de atestado de esterilização para fins de contratação, bem como qualquer prática discriminatória que se utilize deste argumento para não contratar, não promover, dispensar do trabalho, remunerar e oferecer oportunidades de ascensão profissional de forma diferenciada e/ou impedir o acesso para inscrição ou aprovação em concursos. Também é expressamente proibido que o empregador ou preposto realize revistas íntimas nas empregadas.
Veja, a seguir, alguns casos analisados na Justiça do Trabalho mineira sobre os direitos da empregada gestante
Empregada que sofreu aborto pelo trabalho em atividades incompatíveis com sua condição de gestante será indenizada
A 4ª Turma do TRT-MG, adotando o entendimento da relatora, desembargadora Paula Oliveira Cantelli, julgou favoravelmente o recurso de uma trabalhadora para condenar a empresa a lhe pagar indenização por danos morais de R$10.000,00, em razão de aborto que sofreu pela execução de atividades incompatíveis à condição de gestante.
A reclamante tinha sido dispensada anteriormente pela empresa, que a readmitiu, ao tomar conhecimento da gravidez da empregada. Contudo, ao retornar, ela foi transferida da recepção para o setor de depósito, onde tinha que carregar caixas de bebidas, com aproximadamente 15 kg, retirando-as do chão ou de um carrinho e colocando-as sobre a mesa, para fazer a separação e conferência da mercadoria. Ela não transportava as caixas, mas realizava essa atividade várias vezes ao dia. E assim fez por quatro dias, até que sofreu o aborto e foi afastada por licença médica. Tudo isso foi demonstrado pela prova testemunhal e também pela perícia realizada no processo.
De acordo com a relatora, embora a perícia tenha concluído pela inexistência de nexo causal entre as atividades da reclamante e o aborto sofrido, o fato é que o próprio perito, em seu laudo, reconheceu que o fato de carregar caixas com cerca de 15 kg pode ter sido a "gota d¿água que falta para a confirmação da ameaça de aborto". Nesse contexto, destacou a relatora, constata-se a conduta culposa da empresa que, ao readmitir a empregada gestante, a transferiu da função de balconista para o depósito, o que, se não foi determinante, certamente contribuiu para que ela sofresse o aborto.
Na decisão, a relatora ressaltou que há tratamento constitucional especial e protetivo da mulher e, especialmente, com absoluta prioridade, ao nascituro, sendo dever da família, da sociedade e do Estado, protegê-lo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, nos termos do art. 227 da CR/88. Citou a Convenção nº 3 da OIT, ratificada pelo Brasil, que traça diretrizes para proteção das mulheres nos períodos antecedente e posterior ao parto, tendo, como objetivo principal, a proteção à maternidade. Também se referiu ao artigo 392, §4º, inciso I, da CLT, que garante à empregada gestante a transferência de função, quando as condições de saúde o exigirem e, ainda, o artigo 19, §1º, da Lei 8213/91, que estabelece a obrigação da empresa quanto à adoção de medidas de proteção e segurança da saúde do trabalhador. No plano constitucional, a relatora observou que é dever do empregador adotar todos os cuidados em relação à dignidade de seus empregados, advindo tal responsabilidade do dever de proteção ao meio ambiente do trabalho e da função social da empresa, nos termos dos artigos 170, inciso III e 200, inciso VIII, da Constituição da República.
"Partindo-se dessas normas legais, é claro que, assim que teve ciência da gravidez da reclamante, ao readmiti-la, a empresa deveria tê-la mantido nas mesmas funções de balconista como, aliás, continuou constando em sua CTPS e não transferi-la para setor que poderia exigir maior esforço físico e levar ao aborto, como, de fato, veio ocorrer", destacou a relatora, em seu voto.
Tendo em vista a omissão da empresa, o nexo causal e o evidente prejuízo moral causado à reclamante pelo descaso da empregadora com a sua condição de gestante, a desembargadora concluiu pela configuração do dano moral e, assim, modificou a sentença de primeiro grau para conceder à reclamante a indenização decorrente, arbitrada em R$10.000,00. O entendimento da relatora foi acompanhado pelos demais julgares da Turma. (Processo PJe nº 0010515-29.2015.5.03.0077-RO - assinado em 18/11/2016)
Atraso no pagamento do salário-maternidade gera danos morais
Nesse caso, analisado pela 6ª Turma do TRT mineiro, ficou constatado o atraso da empregadora no pagamento de verbas rescisórias e salários à reclamante, incluindo os salários pelo período da licença-maternidade que ela havia usufruído. Seguindo o voto do juiz convocado relator, Carlos Roberto Barbosa, a Turma julgou favoravelmente o recurso da empregada para conceder a ela indenização por danos morais, fixada em R$3.000,00. Para os julgadores, a empresa deixou a empregada em dificuldades num momento de intensa necessidade, em total desrespeito às condições da licença-maternidade, gerando abalo à moral à reclamante, abalo esse que independe de prova concreta.
Veja o que disse o relator, na decisão:
"O empregador, ao negar o pagamento do salário maternidade, expõe a trabalhadora à própria sorte, de modo a afrontar incisivamente o princípio constitucional da pessoa humana; ademais, a atitude inviabiliza o objetivo maior da estabilidade da gestante - o de garantir proteção ao nascituro -, pois nada adianta o afastamento das atividades profissionais, se tal medida não for acompanhada do pagamento dos salários, cujos valores permitiriam, no momento oportuno, a subsistência material da ofendida e de sua família, sem lhe causar os sentimentos de angústia e aflição por não saber até quando ficaria privada da quantia, situação que reclamada a imposição da obrigação de indenizar os danos morais provocados".(Processo PJe nº 0010481-47.2016.5.03.0165-RO - assinado em 27/10/2016).
Parto prematuro de natimorto não se confunde com aborto e gera direito à estabilidade da gestante e ao salário-maternidade
"A eventualidade de o filho da trabalhadora gestante nascer sem vida, em parto prematuro, não afasta a garantia de emprego de que trata o art. 10, inciso II, alínea "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988". Assim se manifestou a 8ª Turma do TRT mineiro que, em decisão de relatoria do desembargador Márcio Ribeiro do Vale, julgou desfavoravelmente o recurso de uma empresa de telefonia, para reconhecer o direito de uma empregada que teve parto prematuro de natimorto à estabilidade provisória da gestante. Com isso, a Turma modificou a sentença de primeiro grau e condenou a empregadora a pagar à reclamante a indenização correspondente aos salários do período da estabilidade, com devidos reflexos.
A empresa disse que a trabalhadora sofreu aborto espontâneo, o que não lhe confere o direito à pretendida estabilidade da gestante, mas apenas ao descanso de 2 semanas previsto no artigo 395 da CLT. Mas, o laudo médico apresentado comprovou que não houve aborto involuntário, mas, sim, parto prematuro de natimorto com 32 semanas de gestação. E, segundo o relator, o artigo 10, II, b do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, assim como o artigo 392 da CLT e a lei previdenciária, não determinam que a criança precisa nascer com vida, para que a trabalhadora adquira o direito à licença-maternidade e à garantia do emprego. "E onde o legislador não distinguiu não cabe ao intérprete distinguir", ressaltou.
O relator chamou a atenção para as diferenças entre o aborto e o parto antecipado de natimorto (quando a criança nasce sem vida). É que, conforme ressaltou, o parágrafo 3º do artigo 294, da IN INSS/PRES nº 45 de 06/08/2010 "considera-se parto, para finas de concessão do salário-maternidade, o evento ocorrido a partir da 23ª semana (6º mês) de gestação", mesmo que a criança nasça sem vida. E, no caso, a reclamante já contava com 32 semanas de gestação quando ocorreu o parto do seu bebê que, infelizmente, não sobreviveu. Logo, é evidente que não se trata de aborto, mas de parto prematuro de natimorto. Para fundamentar a decisão, o desembargador citou o § 5º do mesmo artigo, segundo o qual, tratando-se de parto antecipado ou não, ainda que de natimorto, a segurada terá direito os 120 dias de licença-maternidade, bastando que apresente a certidão de óbito da criança, o que foi devidamente observado pela reclamante. (Processo nº 0000229-65.2015.5.03.0182-RO - acórdão publicado em 28/07/2015).
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 21/03/2017.
Abraços...

quinta-feira, 23 de março de 2017

FALTAS DE EMPREGADOS POR MOTIVO DE GREVE. DESCONTOS DOS DIAS PARADOS

A 5ª Turma do TRT-MG, acolhendo o voto do relator, juiz convocado João Alberto de Almeida, julgou favoravelmente um recurso da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA/MG), para absolvê-la da condenação de restituir os valores descontados de alguns de seus empregados em razão da paralisação parcial ocorrida em 15/07/2014.
A ação trabalhista foi ajuizada contra e COPASA pelo SINDÁGUA MG- Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgoto do Estado de Minas Gerais que, na qualidade de substituto processual dos empregados que se aderiram à greve, pediu que a empresa fosse condenada a lhes restituir os dias parados. O pedido foi atendido na sentença recorrida, mas, ao analisar recurso da COPASA, a Turma revisora deu razão à empresa e reverteu a decisão, rejeitando o pedido do sindicato.
O relator ressaltou que vem prevalecendo na Seção Especializada de Dissídios Coletivos do TST o entendimento de que o empregador não pode ser obrigado a pagar aos empregados a remuneração correspondente aos dias parados no período de greve, independentemente de o movimento ter sido ou não declarado como abusivo pelas autoridades.
E, conforme lembrou o julgador, o art. 7º da Lei nº 7.783/89 dispõe que: "a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho." Além disso, ele frisou que o risco de não receber os salários pelos dias parados é inerente ao movimento e, em regra, deve ser assumido pelos seus participantes, como ocorre com o exercício de qualquer direito.
"Desde que o empregador não contribua de forma decisiva para a greve (o que ocorreria, por exemplo, com o atraso de salários), ele está autorizado, em regra, a descontar dos empregados os dias em que aderiram à paralisação", destacou o relator.
E, no caso, as provas demonstraram que a greve teve como motivo a busca de melhores condições de trabalho aos empregados, já que não houve êxito nas tentativas de negociação entre a empresa e o SINDÁGUA. Por fim, para reforçar ainda mais a decisão, o relator citou jurisprudência da Seção de Dissídios Coletivos do TST no mesmo sentindo do seu entendimento.
Os fundamentos do relator foram acolhidos pelos demais julgadores da Turma.
Processo nº 0001401-71.2014.5.03.0022 RO:
EMENTA: GREVE – DESCONTOS DOS DIAS PARADOS - LICITUDE. A greve, como regra, configura uma hipótese de suspensão do contrato de trabalho (art. 7º da Lei 7.783/89). Portanto, na eventualidade de greve, independentemente de as reivindicações serem justas e de não haver qualquer abusividade, inexiste a prestação de serviços e, paralelamente, também cessa a obrigação do empregador de pagar salários.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 15/03/2017.
Abraços...

quarta-feira, 22 de março de 2017

EMPREGADO. AUXÍLIO DOENÇA. PERÍODO ENTRE A CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA E RETORNO AO TRABALHO DO EMPREGADO

O trabalhador foi admitido pela construtora em março de 2009 e, em maio do mesmo ano, afastou-se do trabalho por problemas de saúde que não tinham qualquer relação com o trabalho. Ele recebeu o auxílio-doença do INSS até que, em 15/10/2013, aposentou-se por invalidez. Em abril de 2013, o INSS suspendeu seu benefício, por entender que ele não estava incapacitado para o trabalho. Aí então, o trabalhador até tentou retornar ao serviço, mas foi impedido, já que o setor médico da empregadora concluiu que ele não tinha condições de trabalhar e novamente o encaminhou ao órgão previdenciário. Mas só cerca de seis meses depois, o INSS acabou reconhecendo a incapacidade, concedendo a ele a aposentadoria por invalidez. Ocorre que, durante esse período, o trabalhador ficou sem receber salários, porque não prestou serviços à empregadora, e, também, sem receber o benefício que lhe era devido pelo INSS.
Esse o cenário encontrado pelo juiz Gastão Fabiano Piazza Júnior, ao analisar, na 15ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, a ação em que o empregado pretendia receber da construtora os salários relativos aos seis meses em que ficou sem receber a remuneração da empresa e também o auxílio doença do INSS. Como se vê, essa é mais uma situação de "limbo jurídico do empregado", tão conhecida na Justiça do Trabalho mineira. Mas, no caso, o magistrado entendeu que a empresa não estava obrigada a pagar os salários pretendidos pelo trabalhador.
O entendimento foi que, como ele estava incapacitado para o trabalho, o que se confirmou com a posterior concessão da aposentadoria por invalidez pelo INSS, a empresa não poderia mesmo ter aceitado que ele retornasse às atividades. Assim, nesse caso, a empregadora agiu de forma correta e, como o trabalhador não lhe prestou serviços no período, não tinha ela a obrigação de pagar ao empregado os salários do período em que o INSS, injustamente, deixou de lhe pagar o auxílio-doença.
Na sentença, o julgador ressaltou que, de fato, cessado o benefício previdenciário, surge para o empregador o dever de colocar o emprego à disposição e efetuar o pagamento dos salários e dos demais encargos trabalhistas. Entretanto, nesse caso, o trabalhador não se encontrava apto para o trabalho, tanto assim que o próprio INSS reviu seu entendimento, concedendo a ele posteriormente a aposentadoria por invalidez. Essa circunstância, na visão do juiz, sem dúvida, torna legítima a negativa da empresa em aceitar o retorno do trabalhador às atividades.
"Não seria viável obrigar a empresa ao cumprimento de obrigação que deveria ter sido assumida pelo INSS", destacou o magistrado, acrescentando que caberia ao trabalhador buscar judicialmente o restabelecimento do benefício previdenciário na esfera Federal. O Juiz lembrou, ainda, que a situação tem previsão legal, precisamente no artigo 62 da Lei nº 8.213/91 (com a redação dada pela Medida Provisória número 739, de 2016) que dispõe: "Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional. Parágrafo único. O benefício será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, for aposentado por invalidez."
Ausente a prestação de serviços no período objeto do pedido e não podendo ser atribuída a responsabilidade à ré, o julgador negou os pedidos de pagamento de salários no período entre abril de 2013 a 15/10/2013. Na sentença, ele citou jurisprudência do TRT mineiro no mesmo sentido. Da decisão ainda cabe recurso ao TRT MG.
PJe: Processo nº 00011184-76.2015.503.0079. Sentença em: 09/02/2017.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 15/03/2017.
Abraços...

terça-feira, 21 de março de 2017

EMPREGADO. AUXÍLIO DOENÇA. PERÍODO ENTRE A CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA E RETORNO AO TRABALHO DO EMPREGADO

O trabalhador foi admitido pela construtora em março de 2009 e, em maio do mesmo ano, afastou-se do trabalho por problemas de saúde que não tinham qualquer relação com o trabalho. Ele recebeu o auxílio-doença do INSS até que, em 15/10/2013, aposentou-se por invalidez. Em abril de 2013, o INSS suspendeu seu benefício, por entender que ele não estava incapacitado para o trabalho. Aí então, o trabalhador até tentou retornar ao serviço, mas foi impedido, já que o setor médico da empregadora concluiu que ele não tinha condições de trabalhar e novamente o encaminhou ao órgão previdenciário. Mas só cerca de seis meses depois, o INSS acabou reconhecendo a incapacidade, concedendo a ele a aposentadoria por invalidez. Ocorre que, durante esse período, o trabalhador ficou sem receber salários, porque não prestou serviços à empregadora, e, também, sem receber o benefício que lhe era devido pelo INSS.
Esse o cenário encontrado pelo juiz Gastão Fabiano Piazza Júnior, ao analisar, na 15ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, a ação em que o empregado pretendia receber da construtora os salários relativos aos seis meses em que ficou sem receber a remuneração da empresa e também o auxílio doença do INSS. Como se vê, essa é mais uma situação de "limbo jurídico do empregado", tão conhecida na Justiça do Trabalho mineira. Mas, no caso, o magistrado entendeu que a empresa não estava obrigada a pagar os salários pretendidos pelo trabalhador.
O entendimento foi que, como ele estava incapacitado para o trabalho, o que se confirmou com a posterior concessão da aposentadoria por invalidez pelo INSS, a empresa não poderia mesmo ter aceitado que ele retornasse às atividades. Assim, nesse caso, a empregadora agiu de forma correta e, como o trabalhador não lhe prestou serviços no período, não tinha ela a obrigação de pagar ao empregado os salários do período em que o INSS, injustamente, deixou de lhe pagar o auxílio-doença.
Na sentença, o julgador ressaltou que, de fato, cessado o benefício previdenciário, surge para o empregador o dever de colocar o emprego à disposição e efetuar o pagamento dos salários e dos demais encargos trabalhistas. Entretanto, nesse caso, o trabalhador não se encontrava apto para o trabalho, tanto assim que o próprio INSS reviu seu entendimento, concedendo a ele posteriormente a aposentadoria por invalidez. Essa circunstância, na visão do juiz, sem dúvida, torna legítima a negativa da empresa em aceitar o retorno do trabalhador às atividades.
"Não seria viável obrigar a empresa ao cumprimento de obrigação que deveria ter sido assumida pelo INSS", destacou o magistrado, acrescentando que caberia ao trabalhador buscar judicialmente o restabelecimento do benefício previdenciário na esfera Federal. O Juiz lembrou, ainda, que a situação tem previsão legal, precisamente no artigo 62 da Lei nº 8.213/91 (com a redação dada pela Medida Provisória número 739, de 2016) que dispõe: "Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional. Parágrafo único. O benefício será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, for aposentado por invalidez."
Ausente a prestação de serviços no período objeto do pedido e não podendo ser atribuída a responsabilidade à ré, o julgador negou os pedidos de pagamento de salários no período entre abril de 2013 a 15/10/2013. Na sentença, ele citou jurisprudência do TRT mineiro no mesmo sentido. Da decisão ainda cabe recurso ao TRT MG.
PJe: Processo nº 00011184-76.2015.503.0079. Sentença em: 09/02/2017.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 15/03/2017
Abraços...

segunda-feira, 20 de março de 2017

EMPREGADOR. OBRIGAÇÃO DE ATINGIR A COTA MÍNIMA DE CONTRATAÇÃO DE TRABALHADORES COM DEFICIÊNCIA

"Não bastam atitudes cômodas ou atos formais, tais como publicação de anúncios ou solicitações a agências de empregos, para a empresa se desvencilhar da obrigação de atingir a cota mínima de contratação de trabalhadores com deficiência. Exige-se que ela providencie a preparação do local e da rotina de trabalho, para que, de fato, promova a inclusão desses cidadãos na vida profissional. É que a obrigação da implantação de um ambiente de trabalho aberto, inclusivo e acessível, de acordo com o artigo 27 da Convenção Internacional de Nova York, cobra uma atitude afirmativa de responsabilidade social da empresa, visando garantir o direito ao trabalho digno das pessoas com deficiência". Adotando esses fundamentos, expressos no voto do relator, desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, a Primeira Turma do TRT-MG julgou desfavoravelmente o recurso de uma empresa de transporte de passageiros e manteve a multa que lhe foi aplicada pelo MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) pelo desrespeito da cota mínima legal de contratação de trabalhadores com deficiência.
Esforço não demonstrado - O auto de infração emitido contra a empresa registrou o descumprimento da cota de 5% prevista no inciso IV do artigo 93 da Lei nº 8.213/91, tendo em vista que, na época, ela contava em seus quadros com apenas nove empregados com deficiência ou reabilitados pelo INSS, quando, pela norma legal, deveria contar com pelo menos 157, já que possuía mais de 1000 empregados. E, além disso, conforme observou o relator, a empresa não demonstrou que tomou todas as medidas necessárias para tornar possível a contratação desses trabalhadores.
Uma testemunha chegou a afirmar que publicava anúncios, inclusive em jornais, solicitando candidatos para preencher as vagas na empresa destinadas aos trabalhadores com deficiência. Mas, em seu exame, o desembargador constatou que nenhuma cópia desses anúncios foi apresentada. Ele também comentou a afirmação da empresa de que teria realizado convênios e contatos com entidades governamentais e privadas buscando promover a admissão de trabalhadores reabilitados ou com necessidades especiais em seus quadros: "A ré não preparou o ambiente de trabalho para torná-lo acessível e inclusivo. Simples atos formais, como publicação de anúncios ou realização de convênios, não suprem o que se apresenta como a responsabilidade social da empresa contemporânea, após a incorporação no ordenamento nacional da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência", destacou o desembargador.
Tutela internacional - Para fundamentar a decisão, o julgador citou o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que prevê que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos, consagrando o princípio da igualdade. Ressaltou, no mesmo sentido, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) que estabelece que os direitos ali previstos serão exercidos sem discriminação de qualquer natureza. No âmbito internacional trabalhista, ele lembrou que as Convenções 100 e 111 da OIT vedam o tratamento discriminatório no campo das relações de trabalho, citando a Convenção 159 que, especificamente, trata da reabilitação profissional e inserção das pessoas com deficiência no emprego.
Ainda no plano da tutela internacional, o relator deu especial destaque à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Nova York, 2007) que, conforme explicou, foi ratificada no Brasil com quórum qualificado de emenda constitucional e cujo conceito de deficiência, na visão do desembargador, representa um avanço em relação às legislações tradicionais que normalmente enfocavam o aspecto clínico da deficiência: "As limitações físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais passaram a ser consideradas atributos das pessoas, o que possibilita afirmar-se que a deficiência é a combinação de limitações pessoais com impedimentos culturais, econômicos e sociais. Assim, deslocou-se a questão do âmbito do indivíduo com deficiência para as sociedades, que passaram a assumir a deficiência como problema de todos", ressaltou, em seu voto. E completou: "Com a Convenção de Nova York, formou-se a ideia de que as limitações de caráter físico, mental, intelectual ou sensorial são atributos pessoais que se acabam por restringir o acesso aos direitos, não pelos efeitos que tais impedimentos produzem em si mesmos, mas, principalmente, em consequência das barreiras sociais, ambientais e culturais impostas pela sociedade".
Continuando a discorrer sobre as razões jurídicas que o levaram a reconhecer a validade do auto de infração e da multa aplicada à empresa, o relator observou que o artigo 27 da Convenção de Nova York reconhece o direito das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, "direito este que possui status constitucional, traduzindo-se em direito humano e fundamental", frisou. Ponderou, ainda, que o trabalho representa meio de inserção social da pessoa com deficiência, proporcionando-lhe condições para vida digna, já que possibilita não apenas sustento material, mas a convivência social e o desenvolvimento das aptidões e potencialidades da pessoa.
Sistema de cotas: solução nacional - No Brasil, explicou o desembargador, a tutela normativa e principiológica da pessoa com deficiência centra-se nos artigos 5º, caput e 3º, IV, os quais, em conjunto, asseguram a igualdade substancial e autorizam o Estado a adotar ações afirmativas (políticas públicas e de integração social) com o intuito de concretizar o princípio da dignidade da pessoa humana. E, conforme destacou, não é demais lembrar que todos os direitos contidos na Convenção das Pessoas com Deficiência são normas constitucionais, em virtude da ratificação, pelo Brasil, do tratado da Organização das Nações Unida com quórum de 3/5.
"Como forma de promover a inclusão social do trabalhador com deficiência, com fundamento no princípio da igualdade substancial, o artigo 93 da Lei 8.213/91 criou, assim, um sistema de quotas. Trata-se de obrigação de cunho eminentemente promocional, decorrente da função social da empresa, em que ela deve tomar todas as medidas ambientais e sociais para inspirar a pessoa com deficiência a lhe prestar serviços, de forma subordinada. Neste sentido, é dever da empresa instituir programa de inclusão social da pessoa com deficiência, que envolve, não só a publicação de anúncios e o contato de agencias de emprego, mas também a preparação do ambiente e da rotina do trabalho, o fornecimento de treinamento e, ainda. a acessibilidade, tudo para que permitir a real inserção da pessoa com deficiência no ambiente produtivo da empresa. E a imposição de implantação de um ambiente propício à contratação desses cidadãos cobra da empresa atitudes afirmativas de responsabilidade com o trabalho aberto, inclusivo e acessível, decorrente da responsabilidade social da empresa estabelecida na Convenção Internacional de Nova York, especialmente no seu artigo 27", frisou o julgador.
Ambiente inclusivo e igualdade de oportunidades - E não parou por aí. Partindo para a legislação nacional, o desembargador salientou que, para imprimir ampla aplicação à Convenção Internacional de Nova York, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a recente Lei 13.146 de 6 de julho de 2015, especificou ainda mais os princípios consagrados na Convenção, impondo ao empregador a responsabilidade social e trabalhista de, não apenas abrir vagas, mas também de garantir um ambiente de trabalho acessível e inclusivo, ao dispor, em seu artigo 34, que: "A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em igualdade de oportunidades em ambiente acessível e inclusivo com as demais pessoas.§ 1o As pessoas jurídicas de direito público, privado ou de qualquer natureza são obrigadas a garantir ambientes de trabalho acessíveis e inclusivos".
Além disso, continuou o relator, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência - LBIPD, determina que a inserção desses trabalhadores se processe de forma competitiva, ou seja, de maneira que possam competir em igualdade de condições com os demais trabalhadores, seja com a preparação do ambiente de trabalho, seja com o fornecimento de recursos de tecnologia assistiva: "Art. 37. Constitui modo de inclusão da pessoa com deficiência no trabalho a colocação competitiva, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, nos termos da legislação trabalhista e previdenciária, na qual devem ser atendidas as regras de acessibilidade, o fornecimento de recursos de tecnologia assistiva e a adaptação razoável no ambiente de trabalho". E, no mesmo sentido da Convenção Internacional de Nova York, essa lei também consagra a responsabilidade social da empresa na promoção da inclusão dos trabalhadores com necessidades especiais, estabelecendo que deve ser incentivada não só pelas políticas públicas, mas também pela gestão privada.
Descaso reiterado - "No caso, percebe-se do auto de infração que a ré foi notificada para comparecer na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Minas Gerais, mas não apresentou defesa e nem mesmo compareceu no órgão no dia e hora marcados. Não se pode deixar de registrar, também, que consta do auto de infração que a reclamada já havia sido autuada por duas vezes (anos de 2007 e 2012) pelas mesmas razões e que a quantidade de empregados com deficiência ou reabilitados diminuiu sensivelmente no ano de 2014 (de 22 para 9 empregados), apesar do número geral de empregados ter aumentado", registrou o relator, na decisão. Para finalizar, ele frisou que a ré não fez prova convincente de que, de fato, se esforçou para preencher a totalidade do percentual de vagas destinadas a pessoas reabilitadas pela Previdência Social ou com deficiência.
Por todas essas razões, a Turma concluiu pela validade do auto de infração do Ministério do Trabalho e Emprego, que goza de presunção de legitimidade, sendo mantida a multa administrativa aplicada à ré pelo descumprimento da cota mínima prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/91.
PJe: Processo nº 0010215-31.2016.5.03.0110 (RO). Acórdão em: 17/10/2016.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 20/03/2017.
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