sábado, 20 de julho de 2019

CONTRATO DE TRABALHO INTERMITENTE. ASPECTOS LEGAIS

A reforma trabalhista implementada pela Lei nº 13.467, de 2017, trouxe diversas mudanças em dispositivos da CLT, criando, alterando e excluindo definições que existiam anteriormente.
Dentre essas mudanças, veio o contrato de trabalho intermitente – CLT, arts. 443, caput e § 3º, e 452-A.
Segundo dispõe o § 3º do artigo 443 da CLT, “considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria”.
Nos termos do artigo 452-A, caput, da CLT, “o contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não”.
CLT, artigo 452-A, artigo incluído pela Lei nº 13.467/2017, com efeitos a partir de 11/11/2017:
Art. 452-A. O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não.
§ 1º O empregador convocará, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de antecedência.
§ 2º Recebida a convocação, o empregado terá o prazo de um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa.
§ 3º A recusa da oferta não descaracteriza a subordinação para fins do contrato de trabalho intermitente.
§ 4º Aceita a oferta para o comparecimento ao trabalho, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de trinta dias, multa de 50% (cinquenta por cento) da remuneração que seria devida, permitida a compensação em igual prazo.
§ 5º O período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador, podendo o trabalhador prestar serviços a outros contratantes.
§ 6º Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas:
I – remuneração;
II - férias proporcionais com acréscimo de um terço;
III - décimo terceiro salário proporcional;
IV - repouso semanal remunerado; e
V - adicionais legais.
§ 7º O recibo de pagamento deverá conter a discriminação dos valores pagos relativos a cada uma das parcelas referidas no § 6º deste artigo.
§ 8º O empregador efetuará o recolhimento da contribuição previdenciária e o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na forma da lei, com base nos valores pagos no período mensal e fornecerá ao empregado comprovante do cumprimento dessas obrigações.
§ 9º A cada doze meses, o empregado adquire direito a usufruir, nos doze meses subsequentes, um mês de férias, período no qual não poderá ser convocado para prestar serviços pelo mesmo empregador.
Todavia, vale observar que no Judiciário, a primeira decisão de segunda instância contra o trabalho intermitente veio de Minas Gerais. Em sessão ordinária realizada no dia 29/10/2018, por unanimidade, a Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT3 – TRT/MG) considerou nulo um contrato de trabalho, na modalidade intermitente, por entender que a modalidade não deve ser utilizada para atividades rotineiras e contínuas dentro de uma empresa.
Para o desembargador relator, José Eduardo de Resende Chaves Júnior, “o trabalho em regime intermitente é lícito de acordo com a nova legislação, todavia, deve ser feito somente em caráter excepcional, ante a precarização dos direitos do trabalhador, e para atender demanda intermitente em pequenas empresas, sobretudo, não podendo ser utilizado para suprir demanda de atividade permanente, contínua ou regular”.
No entendimento da Primeira Turma do TRT-MG, “não é cabível a utilização de contrato intermitente para atender posto de trabalho efetivo dentro da empresa”. Portanto, no entender do relator, o contrato de trabalho intermitente deve ser feito “somente em caráter excepcional, ante a precarização dos direitos do trabalhador, e para atender demanda intermitente em pequenas empresas, sobretudo, não podendo ser utilizado para suprir demanda de atividade permanente, contínua ou regular”.
Vejam a decisão:
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO
PROCESSO nº 0010454-06.2018.5.03.0097 (ROPS)
RECORRENTE: ...
RECORRIDO: MAGAZINE ... S/A
RELATOR: JOSÉ EDUARDO DE RESENDE CHAVES JÚNIOR
O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da Primeira Turma, hoje realizada, preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso do porque próprio, tempestivo e preenchidos os demais pressupostos intrínsecos reclamante, e extrínsecos de admissibilidade; no mérito, sem divergência, deu-lhe provimento parcial para determinar que os honorários advocatícios sucumbenciais atribuídos ao reclamante beneficiário da justiça gratuita ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade pelo prazo de 02 (dois) anos, nos termos do parágrafo 4º do artigo 791-A, da CLT, até que se prove o contrário quanto à situação de pobreza do autor que deu ensejo à concessão da justiça gratuita, sendo que, transcorrido tal interstício, declara-se desde já extinta a obrigação, bem como para declarar a nulidade da contratação do reclamante pelo regime intermitente e condenar a reclamada a: a) diferenças salariais durante todo o período contratual, considerando o salário mensal do autor como sendo de R$1.375,00 (um mil, trezentos e setenta e cinco reais); b) aviso prévio de 30 dias, com reflexos em férias + 1/3, 13º salário, horas extras e FGTS + 40%; c) retificação da CTPS do autor para fazer constar a data de saída, incluindo a projeção do aviso prévio, como sendo em 28/03/2018, assim como o real salário; d) 13º salário proporcional; e) férias proporcionais + 1/3; f) depósito do FGTS referente aos meses de novembro/17, dezembro17, janeiro/18 e fevereiro/18, a serem calculados com base no salário deferido; g) multa de 40% do FGTS; h) fornecer ao reclamante a chave de conectividade e as guias TRCT, no código R12, e CD/SD, no prazo de 15 dias contados do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de multa de R$100,00 (cem reais) por dia, devendo ainda os réus arcar com indenização substitutiva do seguro-desemprego, na hipótese de não recebimento por culpa do empregador, bem como responder pela integralidade dos depósitos de FGTS. Tudo como se apurar em liquidação, autorizada a dedução dos valores já pagos a idêntico título. Atribuiu à condenação o valor de R$8.000,00 (oito mil com custas, pela reclamada, no importe de R$160,00 (cento e sessenta reais), invertidos reais), que ficam os ônus da sucumbência. São os fundamentos: NULIDADE DA CONTRATAÇÃO NA MODALIDADE INTERMITENTE. O reclamante alega que foi contratado na função de assistente de loja, com data de admissão em 21/11/2017 e dispensa imotivada em 26/02/2018, pela modalidade de regime intermitente, introduzida pela Lei 13.467/2017. Pleiteia seja declarada a nulidade da contratação por regime intermitente, por ofensa aos princípios da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho. Requer a condenação da reclamada ao pagamento de salário de todo o período contratual, 13º salário proporcional, férias acrescidas do terço constitucional, aviso prévio indenizado e reflexos, recolhimento de FGTS durante todo período laborado e multa rescisória de 40%, devendo ser deduzidas as parcelas já pagas a idêntico título. O d. Juízo a quo indeferiu o pleito por considerar que a prestação de serviços se deu na vigência da Lei 13.467/2017, com redação da Medida Provisória 808, motivo pelo qual considerou o contrato plenamente legal e possível, não violando os princípios da dignidade da pessoa humana e nem da vedação ao retrocesso social. Decidiu ainda que ficou assegurado o pagamento de valor hora em consonância com o salário mínimo em vigor. Ao exame. O contrato de trabalho pelo regime intermitente foi introduzido nos artigos 443 e 452-A da denominada Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), a qual foi elaborada com o objetivo primordial de simplificar e modernizar as relações de trabalho, sem que, com isso, haja precarização do emprego, como restou amplamente divulgado pela mens legislatoris. A nova lei definiu o contrato de trabalho intermitente como sendo aquele em que "a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria." Diante de tal redação, entende-se o contrato de trabalho intermitente como sendo uma contratação excepcional, em atividade empresarial descontínua. Assim sendo, essa modalidade de contrato, por ser atípica e peculiar, assegura aos trabalhadores patamares mínimos de trabalho e remuneração, devendo então ser utilizada somente para situações específicas. In casu, analisando o contrato de trabalho de Id. d140d84, verificou-se que o reclamante foi contratado pela reclamada Magazine ... em 21/11/2017 para o cargo de assistente de loja, em atividades típicas, permanentes e contínuas da empresa, quais sejam, recepcionar o cliente na loja, conferir produtos e fazer pacotes, efetuar procedimentos de entrega de produtos adquiridos pelo site, contar, conferir e zelar pelo estoque de produtos da loja, entre outras. Nesse sentido, a Anamatra - Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, por meio de sua Comissão 3, redigiu a tese 28 da 19ª CONAMAT, por meio da qual entende que o regime de caráter intermitente é incompatível com a demanda permanente, contínua ou regular ou para substituir posto de trabalho efetivo. Vejamos: "No caso do contrato de trabalho intermitente: "é ilícita a contratação para , contínua ou regular de trabalho, dentro atendimento de demanda permanente do volume normal de atividade da empresa"; é ilegal substituir posto de trabalho efetivo (regular ou permanente) pela contratação do tipo intermitente; não pode o empregador optar por essa modalidade contratual para, sob tal regime, adotar a escala móvel e variável de jornada; acaso contratado na modalidade da intermitência, o trabalhador tem direito subjetivo à convocação, sendo ilícita sua preterição ou a omissão do empregador (Enunciado nº 90 da 2ª Jornada)." Entende-se, portanto, que o trabalho em regime intermitente é lícito de acordo com a nova legislação, todavia, deve ser feito somente em caráter excepcional, ante a precarização dos direitos do trabalhador, e para atender demanda intermitente em pequenas empresas, sobretudo, não podendo ser utilizado para suprir demanda de atividade permanente, contínua ou regular. Não é cabível ainda a utilização de contrato intermitente para atender posto de trabalho efetivo dentro da empresa. No caso, como se trata de uma companhia aberta de capital autorizado, cujo objeto social inclui o comércio varejista e atacadista, em geral; importação e exportação de produtos; o acondicionamento e a embalagem de produtos entre outros (atos constitutivos - Id. 4d3d43a), entende-se que as funções exercidas pelo reclamante enquadram-se em atividade permanente e contínua da empresa. Do mesmo modo, considera-se que a redação do referido artigo 443, § 3º, da CLT, no sentido de que considera-se trabalho intermitente independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, na realidade se refere à função exercida pelo trabalhador e não ao caráter da atividade em si, termos em que, data maxima venia do entendimento esposado pelo d. juízo de primeiro grau, esta Eg. Turma declarou nula a contratação do reclamante pelo regime intermitente. Reconhecida a nulidade da cláusula contratual relativa à modalidade da prestação de serviços (intermitentes), é despicienda a análise das demais alegações recursais a respeito da matéria.VALOR DO SALÁRIO. Quanto às alegações do reclamante de que recebia salário hora inferior ao salário mínimo legal, estas não merecem prosperar, uma vez que o próprio reclamante admitiu em sua exordial (Id. a39a874) que recebia mensalmente R$1.375,00 (um mil, trezentos e setenta e cinco reais), equivalentes a R$6,25 (seis reais e vinte e cinco centavos) por hora na jornada mensal de 220 horas, o que nitidamente respeita o salário mínimo legal, o princípio da garantia salarial e o artigo 78 da CLT. Sendo assim, considera-se o valor de R$1.375,00 (um mil, trezentos e setenta e cinco reais) como sendo o real salário mensal do reclamante, fazendo ele jus às diferenças salariais daí decorrentes, por todo o período laborado. VERBAS RESCISÓRIAS E FGTS. Apesar de constar na página 02 do TRCT (Id. f0d6024) como contrato de trabalho por prazo determinado, no próprio contrato de Id. d140d84 não consta termo final pré-fixado e no tópico 21 do referido documento de TRCT consta como 'Contrato de Trabalho por prazo indeterminado', motivo pelo qual entende-se que o contrato é por prazo indeterminado, que pressupõe a continuidade da relação trabalhista, sendo devida, portanto, a projeção do aviso prévio de 30 dias, a contar da data de dispensa em 26/02/2018. Quanto ao pleito de recolhimento de FGTS por todo o período laborado, ressaltou este d. Colegiado que, à vista do princípio da aptidão para a prova, entende-se que é ônus do empregador a comprovação do correto recolhimento do FGTS. No aspecto, confira-se a seguinte ementa do C. TST: "RECURSO DE REVISTA. DIFERENÇAS NO RECOLHIMENTO DO FGTS. ÔNUS DA PROVA DO RECLAMADO. Esta c. Corte cancelou a Orientação Jurisprudencial 301 da SBDI-1 do c. TST, por concluir que o ônus da prova, nos casos de diferenças de FGTS, será regulado pelo princípio da aptidão para a prova, pois a pretensão resistida em torno da irregularidade dos depósitos do FGTS necessita de confronto com as guias de recolhimento que estão em poder do empregador. À reclamada incumbe o ônus da prova quanto aos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor, a teor dos arts. 818 da CLT e 333, II, do CPC. Recurso de revista conhecido e provido". (TST - RR: 1973009620095020446197300 - 6.2009.5.02.0446, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 29.05.2013, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 07.06.2013). No documento acostado pela reclamada de Id. 45eccee, verifica-se o pagamento de FGTS relativo apenas ao mês da rescisão contratual, não se desincumbindo a reclamada, portanto, de seu encargo probatório quanto aos demais meses da relação trabalhista. São devidas, portanto, as seguintes verbas rescisórias: aviso prévio de 30 dias com os devidos reflexos em 13º salário, férias e FGTS, FGTS + 40%; 13º salário proporcional; férias proporcionais + 1/3; depósito do FGTS referente aos meses de novembro/17, dezembro17, janeiro/18 e fevereiro/18. A reclamada deve, ainda, fornecer ao reclamante a chave de conectividade e as guias TRCT, no código R12, e CD/SD, no prazo de 15 dias contados do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de multa de R$100,00 (cem reais) por dia, devendo ainda os réus arcar com indenização substitutiva do seguro-desemprego, na hipótese de não recebimento por culpa do empregador, bem como responder pela integralidade dos depósitos de FGTS. Todas as parcelas deferidas deverão ser apuradas em liquidação, ficando autorizada, desde já, a dedução dos valores comprovadamente pagos sob os mesmos títulos das verbas aqui reconhecidas. Apesar do d. Juízo a quo ter condenado o reclamante HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais no importe de 5% do valor da causa, nos moldes do artigo 791-A, § 4º, da CLT, cabe ressaltar que a possibilidade de dedução do valor dos honorários advocatícios sucumbenciais de créditos recebidos pelo reclamante, neste ou em outros processos, só poderia ocorrer se comprovado ficar que houve posterior alteração da condição financeira do trabalhador. Note-se que a norma disposta no aludido parágrafo 4º do artigo 791-A da CLT deve receber uma interpretação axiológica-teleologica, com base nos valores predominantes em nossa ordem jurídica, que buscam promover uma sociedade livre, justa e solidária, promovendo o bem de todos e a redução da desigualdade social. Importante ressaltar, ainda, que a 1ª Turma do STF já firmou entendimento no sentido de que a parte beneficiária da Justiça gratuita somente suportaria a despesa com honorários advocatícios caso os créditos recebidos nos autos alterem a sua condição de miserabilidade, conforme se observa, in verbis: "EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. FGTS. ATUALIZAÇÃO: CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO: SUCUMBÊNCIA. (...) 5. Sendo assim, na liquidação se verificará o "quantum" da sucumbência de cada uma das partes e, nessa proporção, se repartirá a responsabilidade por custas e honorários, sempre ressalvada, quando for o caso, a situação dos beneficiários da assistência judiciária gratuita, que só responderão por tais verbas, quando tiverem condições para isso, nos termos do art. 12 da Lei n° 1.060, de 05.02.1950. 6. Enfim, não está demonstrada a sucumbência mínima dos agravantes. 7. Agravo improvido." (RE 341510 AgR/DF - DISTRITO FEDERAL AG. REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES Julgamento: 29/10/2002). Vale acrescentar que a Colenda SDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho já decidiu que a condenação pecuniária a favor do trabalhador em processo trabalhista, por si só, não lhe elide o direito aos benefícios da Justiça gratuita: "EMENTA: RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE NÃO ELIDIDA POR PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO. O deferimento da gratuidade 1. da justiça depende de simples declaração de pobreza, a teor do art. 790, § 3º, da CLT e nos moldes da OJ 304/SDI-I/TST ("Atendidos os requisitos da Lei nº 5.584/70 (art. 14, § 2º), para a concessão da assistência judiciária, basta a simples afirmação do declarante ou de seu advogado, na petição inicial, para se considerar configurada a sua situação econômica (art. 4º, § 1º, da Lei nº 7.510/86, que deu nova redação à Lei nº 1.060/50)"). 2. E a referida declaração, apresentada pelo reclamante, goza de presunção relativa de veracidade, não restando elidida, no caso, por prova em sentido contrário. 3. Com efeito, o fato de o reclamante ter percebido valores a título de verbas rescisórias e de indenização em decorrência da adesão a plano de demissão voluntária não é suficiente a demonstrar que o mesmo está em situação econômica que lhe permite demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família." (E-RR - 11237-87.2014.5.18.0010, Relator Ministro: Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 02/02/2017, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 10/03/2017). Por conseguinte, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não pode constituir punição à parte, devendo ser observada a legislação atinente aos beneficiários da gratuidade de justiça. Destarte, determinou-se que os honorários advocatícios sucumbenciais atribuídos ao reclamante beneficiário da justiça gratuita ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade pelo prazo de 02 (dois) anos, nos termos do parágrafo 4º do artigo 791-A, da CLT, até que se prove o contrário quanto à situação de pobreza do autor que deu ensejo à concessão da justiça gratuita. Transcorrido tal interstício, declara-se desde já extinta a obrigação. Tomaram parte no julgamento os Exmos. Desembargadores: José Eduardo de Resende Chaves Júnior (Relator), Maria Cecília Alves Pinto (Presidente) e Luiz Otávio Linhares Renault. Presente ao julgamento, o il. representante do Ministério Público do Trabalho, Dr. Sebastião Vieira Caixeta, que se manifestou pelo prosseguimento do feito.
Belo Horizonte, 29 de outubro de 2018.
JOSÉ EDUARDO DE RESENDE CHAVES JÚNIOR
Desembargador Relator
Abraços...

sexta-feira, 19 de julho de 2019

TRABALHO DOMÉSTICO - JARDINAGEM - TRABALHO POR DOIS DIAS NA SEMANA - DIARISTA

O juiz Marcelo Alves Marcondes Pedrosa, em sua atuação na Vara do Trabalho de Contagem-MG, negou o pedido de vínculo empregatício doméstico entre um jardineiro e o morador da residência em que ele prestava serviços dois dias por semana. Para o magistrado, ficou evidente que o trabalhador enquadrava-se na figura de diarista doméstico e que, portanto, jamais manteve com o réu uma relação de emprego. Diante disso, foram rejeitados todos os pedidos formulados na ação trabalhista, que incluíam verbas rescisórias e multa do artigo 477 da CLT, além da anotação da CTPS.
No caso, o trabalhador alegou que exercia a função de jardineiro na residência do réu, com a presença dos pressupostos da relação de emprego (onerosidade, pessoalidade, continuidade e subordinação) previstos no artigo 1º da Lei nº 5.859/72, sucedida pela Lei Complementar nº 150, de 01/06/2015. Entretanto, na própria petição inicial, ele reconheceu que trabalhava nas segundas e sextas-feiras, das 7h às 18h. Diante da constatação de que a prestação de serviços se dava em apenas dois dias por semana, o juiz descartou a presença do requisito da continuidade, concluindo que o jardineiro, de fato, prestava serviços ao réu na condição de diarista. Contribuiu para o entendimento do julgador o fato de o jardineiro ter declarado, em depoimento, que recebia por diária.
A sentença ainda registrou que, tratando-se de prestação de serviço amparada na Lei dos Domésticos (Lei 5.859/72), coube ao réu provar a existência de fatos excludentes da relação de emprego, o que, no caso, foi devidamente cumprido. É que o artigo 1º da Lei Complementar citada é expresso ao dispor que o trabalho realizado em apenas duas vezes por semana exclui o requisito da continuidade, essencial à formação da relação empregatícia de natureza doméstica.
Para finalizar, o juiz frisou que, pela teoria da descontinuidade adotada expressamente no artigo 1º da Lei 5.859/72, configura trabalhador eventual doméstico, exatamente, o chamado diarista doméstico, que presta serviços em distintas residências, vinculando-se a cada uma delas por curto espaço em semana, quinzena ou mês, como ocorreu no caso.
Não houve recurso e o processo foi recolhido ao arquivo provisório.
Processo PJe: 0010159-25.2019.5.03.0164 (RTSum) — Sentença em 11/04/2019.
Nota CPC:
Nos termos do artigo 1º da Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015, que, entre outras providências, dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico:
Art. 1º Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana, aplica-se o disposto nesta Lei.
Parágrafo único. É vedada a contratação de menor de 18 (dezoito) anos para desempenho de trabalho doméstico, de acordo com a Convenção no 182, de 1999, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e com o Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 10/06/2019.
Abraços...

quinta-feira, 18 de julho de 2019

TRT AFASTA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE TERÇO DE FÉRIAS

A 5ª Turma do TRT de Minas julgou favoravelmente o recurso de uma empresa do ramo de aço para determinar a incidência de contribuição previdenciária apenas sobre o valor relativo ao mês de férias do empregado, excluindo a cobrança do INSS sobre o acréscimo de um terço que acompanha a parcela.
O trabalhador obteve em primeira instância o reconhecimento do direito a diversas parcelas. A ex-empregadora recorreu, insurgindo-se contra a decisão. Um dos pontos atacados foi a determinação de incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias. O relator do recurso, desembargador Júlio Bernardo do Carmo, deu razão à empresa.
O acórdão explicou que as férias gozadas possuem natureza jurídica salarial e devem integrar o salário de contribuição. Isso ocorre, inclusive, quando a condenação se refere a diferenças de verbas salariais, considerando as disposições contidas nos artigos 148, da CLT, e 28, inciso I, da Lei nº 8.212/1991. Já quanto ao adicional constitucional (artigo7º, XVII), acrescido ao importe das férias gozadas, o relator apontou que possui a mesma natureza indenizatória do abono pecuniário previsto no artigo 143 da CLT. Nesse caso, não há integração ao salário-de-contribuição, conforme artigo 28, parágrafo 9º, alíneas "d" e "e", item 6, da lei citada.
Nesse sentido, foi citada jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, registrando que o terço constitucional tem natureza indenizatória, pois não constitui pagamento por serviço prestado e nem remuneração de tempo à disposição do empregador. Por isso, não há incidência da contribuição previdenciária sobre a parcela.
Acompanhando o voto, a Turma julgadora deu provimento ao recurso para excluir a determinação de incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional das férias usufruídas.
Processo PJe: 0000806-39.2015.5.03.0054 (RO) — Data: 12/03/2019.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 11/06/2019.
Abraços...

quarta-feira, 17 de julho de 2019

RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR ACORDO ENTRE EMPREGADO E EMPREGADOR. LEI 13.467/17 (CHAMADA REFORMA TRABALHISTA). HOMOLOGAÇÃO NA JUSTIÇA DO TRABALHO

A homologação de acordo extrajudicial pelo juiz trabalhista foi mais uma inovação trazida pela Lei 13.467/17 (chamada Reforma Trabalhista), que inseriu no texto celetista os artigos 855-B a 855-E. Com isso, as partes agora podem requerer ao juízo a homologação de um acordo negociado extrajudicialmente. Em outras palavras: empregado e empregador negociam um acordo, sem a participação do juiz trabalhista, depois procuram a Justiça do Trabalho para homologar o ajuste. Anteriormente à Reforma Trabalhista, apenas se admitiam a realização de acordos nas próprias ações em curso. Entretanto, a jurisprudência trabalhista tem entendido que não há obrigatoriedade de homologação do acordo extrajudicial firmado entre empregados e empregadores se o ajuste não estiver dentro de parâmetros que o juiz considere razoáveis e isentos da possibilidade de fraude.
Recentemente, o juiz Francisco José dos Santos Júnior, em sua atuação na 2ª Vara do Trabalho de Divinópolis, deixou de homologar um acordo extrajudicial entre um trabalhador e uma clínica odontológica. O magistrado observou que os requisitos formais do acordo extrajudicial, exigidos na nova lei, haviam sido preenchidos (petição conjunta e representação dos interessados por advogados diferentes). Mas ele percebeu que o acordo pretendia dar ampla quitação a quaisquer direitos oriundos do contrato de trabalho que existiu entre as partes, o que contraria a lei trabalhista, tornando inviável a sua homologação.
“Os novos dispositivos legais em exame rechaçam a quitação genérica de direitos proposta pelos requerentes”, pontuou o magistrado. Ele ponderou que o artigo 855-C da CLT prevê que o acordo não prejudica a incidência do artigo 477 da CLT, sinalizando que a quitação abrange apenas as parcelas especificadas no ajuste. Para o juiz, se a regra permitisse que todos os direitos do contrato fossem quitados de forma generalizada, não teria feito a ressalva quanto à multa do artigo 477. Ressaltou ainda que o artigo 855-E da CLT deixa claro que os direitos envolvidos no acordo devem ser expressamente especificados para que se viabilize mensurar os limites da suspensão prescricional, levando à conclusão de que outras parcelas, não discriminadas, não integrarão o acordo. “Os requerentes deixaram de observar esses ditames extraídos da norma legal em comento, na medida em que, na petição conjunta, dispuseram que o acordo fornecerá quitação ampla de quaisquer direitos oriundos do contrato havido entre eles”, frisou o julgador.
Mas não foi só: O magistrado acrescentou que o acordo extrajudicial ainda trouxe cláusula que fere preceito de ordem pública. Isso porque, ao mesmo tempo em que as partes reconhecem a existência do contrato de emprego, com diversas referências a fatos e verbas típicas de uma relação empregatícia, ajustam que a CTPS não seria anotada. Segundo o juiz, isso não pode ser admitido, mesmo porque há interesse dos cofres públicos no contexto, no caso o INSS e a Receita Federal, uma vez que não foram feitos recolhimentos de contribuições previdenciárias sobre os salários mensais pagos em decorrência do contrato de trabalho sobre o qual se deu o acordo. Por tudo isso, a sentença negou a homologação do acordo extrajudicial.
“Incumbe ao juiz verificar o conteúdo do acordo extrajudicial, se está revestido de juridicidade e eticidade, sem o que a homologação se torna inviável. No caso, o pedido deve ser negado”, arrematou o juiz.
Não houve recurso e a sentença transitou em julgado.
Processo PJe: 0010296-11.2019.5.03.0098 — Sentença em 24/04/2019.
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 11/06/2019.
Abraços..

terça-feira, 16 de julho de 2019

NAMORO NO TRABALHO DÁ JUSTA CAUSA?

No filme brasileiro  Beijo 2348/72,  baseado em processo real, Dorival (Chiquinho Brandão) beija a colega Catarina (Maitê Proença), durante o horário de trabalho. Resultado: os dois são imediatamente dispensados por justa causa. Na história do diretor Walter Rogério, a rápida e cruel punição teve um dedo do enciumado supervisor Alvarino (Ary Fontoura), que assediava sexualmente Catarina. A partir daí, trava-se uma interessante batalha judicial, na qual o rapaz busca uma reparação contra o que considera uma injustiça cometida pela empresa.
Em defesa, o advogado da empregadora (Antonio Fagundes) alegou que  "à empresa cumpre prezar pela moralidade no local de trabalho, sob pena da enfrentar justa indignação dos pais e maridos das funcionárias que lá trabalham. Lascivo ou não, atentatório ou não, qualquer que seja a sua natureza, o beijo em local e hora de trabalho, não pode ser admitido. Para tudo, há hora e há lugar".
Instância após instância, a questão do beijo no local de trabalho vai sendo debatida, com interessantes argumentos pró e contra, até que chega ao Tribunal Superior do Trabalho. O resultado? Bom, com o perdão pelo "spoiler", a decisão final do ministro do TST (Walmor Chagas) foi:  "Não constitui um ato atentatório à moral o beijo. ... Porque terá sido despedido o empregado? Por causa do beijo em si, ou por que o beijo, segundo o velho autor mineiro, é falta de higiene? ... a espécie não está prevista na lei, e muito menos no regulamento da empresa. O reclamante, se não é primário na prática de beijo, o é pelo menos em qualquer falta de natureza trabalhista. Estamos com o Regional, inexiste falta grave".
Se aqui a arte imita a vida, inspirada que é em fatos reais, a vida tem, cada vez mais, imitado de volta a arte, pois casos como esse têm se repetido, com alguma frequência, nos tribunais trabalhistas por todo o país.
Em dois casos bastante divulgados pela imprensa nos últimos tempos, grandes empresas foram condenadas pelo Tribunal Superior do Trabalho-TST por dispensarem por justa causa empregados que mantinham relacionamento amoroso no ambiente de trabalho. Os argumentos apresentados pelas empregadoras foram de que os empregados teriam praticado falta grave ao descumprir orientações impostas em normas internas. Em ambos os casos, adotou-se entendimento de que a justa causa não poderia ser aplicada, sendo devidas aos trabalhadores injustamente dispensados indenizações por danos morais.
Nas decisões de origem, os regulamentos proibitivos foram reputados inconstitucionais, por ferir em demasia a liberdade pessoal e os direitos de personalidade do empregado. Quando muito, a violação à norma empresarial poderia ensejar punições mais brandas, como advertências, mas não a justa causa.
Em um dos casos, julgados pela 2ª Turma do TST, um operador de supermercado do Walmart começou a namorar uma colega do setor de segurança, com quem passou, mais tarde, a manter união estável. Ao descobrir a relação, a empresa abriu processo administrativo e demitiu os dois no mesmo dia, com base em norma que proíbe os integrantes do setor de segurança de ter relacionamento amoroso com qualquer empregado da empresa ou unidade sob a qual tenham responsabilidade. Para o ministro José Roberto Freire Pimenta, redator do acórdão, houve  "invasão da intimidade e do patrimônio moral de cada empregado e da liberdade de cada pessoa que, por ser empregada, não deixa de ser pessoa e não pode ser proibida de se relacionar amorosamente com seus colegas de trabalho".  A empresa Walmart foi condenada a pagar indenização por dano moral de R$ 30 mil a cada um dos empregados envolvidos.
No outro julgamento, a condenação, desta vez contra as lojas Renner, foi de R$39 mil, prevalecendo o entendimento de que a proibição do relacionamento afetuoso entre empregados fora do ambiente do trabalho caracterizou dano moral, com ofensa ao direito da personalidade humana, especialmente a intimidade e a vida privada. Após o trancamento do recurso de revista na origem, a empresa apresentou agravo de instrumento, que foi examinado pela 2ª Turma do TST. No entender do relator, ministro Renato Lacerda Paiva, o Regional deu o enquadramento exato do caso concreto à norma legal (artigos 186 e 927 do Código Civil). Ademais, qualquer modificação da decisão exigiria nova avaliação dos fatos e provas do processo, conduta que contraria a Súmula 126 do TST.
Na ausência de lei, vale o bom senso
Mas o que diz a legislação brasileira sobre o assunto? Expressamente, não há lei que regule a matéria. A Constituição prevê o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, preceitos que balizam as relações e os julgamentos. Uma boa pitada de educação, respeito, profissionalismo, além de uma dose de bom senso também podem ajudar bastante. Esses ingredientes podem evitar problemas e constrangimentos para todos os envolvidos.
O que há é alguma jurisprudência sobre o tema, sendo majoritário o entendimento de que, em não havendo excessos ou condutas impróprias ao ambiente de trabalho, a justa causa não pode ser aplicada. Sobretudo não de imediato, sem penalidades gradativas, como advertências e suspensões, caso o trabalhador seja pego em atitudes pouco convenientes à imagem pública da empresa ou então que esteja negligenciando o trabalho em prol do romance no horário de serviço. Isso porque a justa causa é a mais grave pena que pode sofrer o trabalhador, comprometendo toda a sua vida profissional, e, por isso, a conduta praticada deve ser grave o bastante para quebrar a confiança entre as partes, justificando a penalidade máxima.
Ou seja, a lição que se tira da jurisprudência do TST é a de que o simples namoro entre colegas de trabalho não deve ser proibido e não enseja a justa causa. Já o comportamento dos namorados no ambiente de trabalho pode ser disciplinado por regras internas e requer a análise de caso a caso para se saber se houve ou não excessos passíveis de punição. No fim, vale sempre mais a discrição, separando bem trabalho e namoro, para não haver problemas nem para a empresa e nem para os empregados enamorados.
Relacionamentos entre colegas na berlinda: casos julgados pelo TRT de Minas
Empregada engravida em relacionamento com colega e é obrigada a pedir demissão: rescisão inválida
Uma trabalhadora alegou que teria sido obrigada pela rede de drogarias onde trabalhava a pedir demissão. Tudo porque namorava um colega de trabalho, seu atual companheiro e de quem esperava um filho. A reclamação foi examinada em 1º Grau pelo juiz Henrique de Souza Mota, na Vara do Trabalho de Ubá. Após avaliar as provas, ele acolheu o pedido de declaração da invalidade da rescisão contratual e condenou a ré a pagar indenização do período da estabilidade. Também deferiu outra indenização por entender que a conduta da empresa causou dano moral à trabalhadora.
A decisão se baseou na prova oral, segundo a qual a empresa adotava política de proibição de namoro entre funcionários. Ficou claro para o juiz que a reclamante pediu demissão por imposição da empresa, de modo a preservar o emprego do seu companheiro e pai de seu filho. O magistrado considerou que a política de proibição de namoro entre os funcionários extrapola os limite do poder empregatício (art. 2º da CLT), caracterizando abuso do poder regulamentar da empresa (art. 187 do CC).  "A prática da empresa viola preceitos constitucionais da dignidade da pessoa humana, da vedação à discriminação e da função social da empresa (art. 1º, III; art. 3º, IV e art. 5º, XXIII; todos da CF) ",  registrou.
Outro fundamento utilizado na decisão foi a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, que veda qualquer tipo de discriminação no ambiente de trabalho. A proibição também viola as disposições da Lei 9029/1995 e afronta diretamente o art. 373-A, II, da CLT, que veda a dispensa motivada em situação familiar ou estado de gravidez.
Ao julgar o recurso da ré, a Turma Recursal de Juiz de Fora deu provimento parcial, apenas para reduzir a indenização para R$ 1 mil.  (Processo nº 01074-2014-078-03-00-2 - 04/11/2014).
Empresa pode recomendar que empregados não mantenham relacionamento amoroso entre si?
Em outro caso, uma empregada contou que namorava um funcionário de grande rede varejista, mas sem demonstrar a relação no local de trabalho. Num domingo à noite o casal foi visto pelo gerente da empresa e, já na segunda-feira, ambos foram advertidos de que não era permitido o namoro de funcionários. Isso resultou na proibição de se aproximarem durante a jornada de trabalho e ameaça de dispensa por justa causa, entre outros constrangimentos impostos ao casal. A versão da trabalhadora foi considerada verdadeira pelo juiz José Ricardo Dily, que julgou a reclamação na 1ª Vara do Trabalho de Barbacena. Ele se convenceu pela prova testemunhal de que a reclamada se posicionava no sentido de proibir o namoro entre os funcionários.  "Nada há que justifique tais atos",  destacou. Reconhecendo que a ré violou a intimidade e a vida privada da reclamante, ofendendo-lhe a dignidade e o patrimônio ideal, o juiz decidiu condenar a empresa ao pagamento de indenização por dano moral.
Mas essa condenação foi excluída pela Turma Recursal de Juiz de Fora, com base no voto do desembargador relator Joao Bosco Pinto Lara, que entendeu não provada a alegada perseguição à empregada e assim se posicionou:  "Evidente que a vida privada do empregado, fora das dependências da empresa, não diz respeito ao empregador, e jamais será possível a sua interferência em seus relacionamentos pessoais. No entanto, é perfeitamente lícita a exigência de que não haja demonstração e troca de afetos no local de trabalho, sem que haja aí qualquer abuso do poder diretivo".
Na visão do desembargador, a mera recomendação aos empregados para que não mantenham relacionamento amoroso entre si não pode ser considerada ilegal, desde que a restrição seja apenas no âmbito interno da empresa. Ainda conforme avaliou, esta conduta também procura evitar problemas com eventuais brigas entre casais, gerando situação de desconforto para os eles próprios e outros colegas de trabalho. São fatores que podem interferir diretamente no andamento normal das rotinas de trabalho e afetar os objetivos empresariais. Nesse contexto, foi dado provimento ao recurso para absolver a empresa da condenação ao pagamento de indenização por danos morais.  (Processo 00311-2011-049-03-00-0, 25/11/2011).
Exigência de comunicação de envolvimentos sentimentais à chefia não é considerada discriminatória
E um trabalhador também pretendeu receber indenização por danos morais, alegando que sua dispensa teria sido motivada pelo fato de manter um relacionamento amoroso com uma colega de trabalho. Ele acusou a empresa varejista de adotar conduta discriminatória e inconstitucional ao controlar a vida sentimental de seus funcionários, exigindo que toda e qualquer relação sentimental fosse comunicada aos superiores.
Já a reclamada, em defesa, sustentou que a dispensa do reclamante não foi discriminatória, mas sem justa causa, em virtude de ele não ter atendido às expectativas da empresa. Explicou que a norma interna determina apenas que os envolvimentos sentimentais sejam comunicados aos superiores, não havendo qualquer cláusula que proíba o namoro entre funcionários.
Neste caso, prevaleceu a versão apontada pela empresa. Isto porque, na visão do juiz Camilo de Lelis Silva, que examinou o caso na Vara do Trabalho de Ituiutaba, a prova não demonstrou que a dispensa decorreu do fato de o reclamante namorar colega de trabalho. Ele considerou a prova frágil, uma vez que a testemunha arrolada pelo empregado apenas ouviu dizer que ele havia sido dispensado por conta de um relacionamento com outra colega de trabalho. Além disso, o próprio reclamante se referiu à existência a boatos.
Para o julgador, a mera existência de normativo interno solicitando que os funcionários comuniquem aos superiores sobre a existência de relacionamento afetivo entre empregados não caracteriza, por si só, violação à intimidade ou à honra. No seu entender, não ficou provado que a comunicação tivesse o intuito discriminatório, nem que era exigida apenas para que a empresa pudesse dispensar os empregados envolvidos. Tanto que a namorada do reclamante continuou trabalhando normalmente, havendo relatos de pessoas que também continuaram trabalhando na empresa mesmo possuindo envolvimento amoroso com outros colegas.  "Não há como imputar-se qualquer responsabilidade à reclamada, ante a ausência de ato ilícito praticado por ela contra o reclamante, e que tenham resultado em danos morais",  concluiu, lembrando que a despedida de um trabalhador é um direito potestativo do empregador. Não houve recurso e a decisão transitou em julgado  (Processo nº 0003058-56.2013.5.03.0063, sentença: 18/09/2013).
Beijo como cumprimento punido com rigor excessivo
Em 2011, uma decisão da 9ª Turma do TRT-MG confirmou a sentença que afastou a justa causa aplicada à empregada de uma empresa de segurança acusada de massagear os ombros de um colega e de beijar outro, no ambiente de trabalho. Na visão da empresa, o comportamento de sua ex-empregada caracteriza incontinência de conduta e mau procedimento. Para justificar a aplicação da penalidade máxima, a empresa juntou ao processo um vídeo que mostra as imagens da trabalhadora massageando e beijando os colegas.
No entanto, os julgadores acompanharam o entendimento expresso na sentença proferida pelo juiz Adriano Antônio Borges, na 38ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, e concluíram que esse motivo é muito banal, sendo insuficiente para embasar a dispensa por justa causa. Conforme enfatizou o relator, desembargador Milton Vasques Thibau de Almeida, um simples cumprimento cordial e um mero toque no ombro não podem ser vistos como atitudes condenáveis, já que esses gestos são aceitos socialmente e não chegaram a causar qualquer prejuízo à empresa. Por isso, o relator concordou com as palavras do juiz sentenciante, quando este afirmou que é ridícula e digna de riso  "a justa causa aplicada à autora, uma jovem mulher, 12 horas enclausurada numa sala, que não almoça, mas beija, porque a alma precisa mais de alimento que o corpo, pois o caminho para a transcendência dista mais que para a morte. Morte, aliás, que a reclamada sepultou ao coisificar a reclamante. Afinal, é mesmo estranho coisa beijar. Nisso a empresa tem razão".
Na avaliação do relator, a empresa exagerou ao pretender encerrar por justa causa um contrato de trabalho que já durava quatro anos, manchando a trajetória profissional da empregada por causa de simples toque e beijo. Segundo o magistrado, caberia aí, no máximo, uma advertência. Portanto, a Turma negou provimento ao recurso da empresa, confirmando a sentença que anulou a justa causa, com a condenação da empresa ao pagamento das parcelas típicas da dispensa imotivada.  (Processo nº 0000123-80.2011.5.03.0138, 05/01/2011).
Gravidez castigada e discriminada: ato abusivo e absurdo.
Também no ano de 2011, a 5ª Turma do TRT-MG analisou um caso que, nas palavras do próprio relator, o juiz convocado Hélder Vasconcelos Guimarães,  "beira as raias do absurdo".  Uma empregada, sem problemas médicos, foi deslocada do seu antigo local de trabalho para a recepção, onde foi proibida de executar qualquer tarefa. O motivo? Simplesmente porque, sendo solteira, engravidou de um colega de trabalho, seu namorado. E ainda foi tachada como "sem vergonha" pela proprietária da empresa. Os julgadores consideraram a conduta da reclamada preconceituosa e fruto de uma inadmissível maledicência. Por isso, mantiveram a rescisão indireta do contrato de trabalho, declarada pelo juiz André Luiz Gonçalves Coimbra, na 1ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, e a condenação ao pagamento de indenização por danos morais.
O relator destacou que não existe norma proibindo relacionamento íntimo no ambiente de trabalho. O que não se aceita é que a ligação afetiva entre colegas traga prejuízos para o cumprimento das tarefas. Mas, nem de leve, houve prova desse acontecimento no processo. Mesmo porque a reclamante e o seu namorado trabalhavam em setores distintos da empresa. O namorado, após o ocorrido, foi dispensado. Já a trabalhadora, por estar grávida e não poder ser dispensada, passou pela situação humilhante e vexatória de ser deslocada de setor, para ficar no ócio, sendo tratada como  "portadora da pior doença infecto-contagiosa existente",  ponderou o magistrado. Por tudo isso, o julgador deu provimento ao recurso da trabalhadora, para aumentar o valor da indenização por danos morais para R$ 10 mil.  (Processo 0001815-74.2010.5.03.0001, 28/06/2011)
Comportamento indevido: motorista é flagrado por câmeras praticando ato libidinoso com mulher dentro do ônibus
Já o caso analisado pela 4ª Turma do TRT de Minas constitui um bom exemplo de comportamento que não se deve ter no ambiente profissional. Imagens gravadas em DVD mostraram o motorista e uma mulher dentro do ônibus em cenas de nítido caráter sexual, que ultrapassaram, em muito, simples beijos e abraços. Por conta disso, ele foi dispensado por justa causa pela empresa de transporte coletivo.
Inconformado, o trabalhador ajuizou reclamação trabalhista, pretendendo a reversão da medida, mas teve seu pedido rejeitado pela juíza Jaqueline Monteiro de Lima, titular da 43ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. A magistrada reprovou a conduta libidinosa adotada no ambiente de trabalho, considerando-a completamente inadequada, além de absolutamente incompatível com o respeito que merece o local de trabalho. Ela considerou a falta grave o suficiente para autorizar a dispensa por justa causa.
Em grau de recurso, o desembargador relator, Júlio Bernardo do Carmo, confirmou a justa causa.  "O respeito ao ambiente de trabalho, mormente no que se refere à impossibilidade de utilização dos seus recintos para prática de atos íntimos, principalmente envolvendo terceiros, traduz dever do obreiro, inafastável por quaisquer das justificativas alegadas",  registrou, frisando que a atitude do motorista quebrou a relação de confiança que deve existir entre patrão e empregado, o que torna desnecessária a comprovação de efetivos prejuízos por parte da empresa. Reconhecendo que a ré agiu nos limites de seu poder diretivo e disciplinar, adotando a medida punitiva apropriada para a gravidade da falta cometida, negou provimento ao recurso e manteve a justa causa aplicada pela empresa. A Turma de julgadores acompanhou o voto.  (Processo nº 00899-2014-181-03-00-0, 30/07/2014)
Fonte: TRT 3ª Região - Assessoria de Comunicação Social, publicada originalmente em 12/06/2019.
Abraços...

segunda-feira, 15 de julho de 2019

CONTRATO DE EXPERIÊNCIA E AUXÍLIO-DOENÇA, INCLUSIVE ACIDENTÁRIO

De acordo com o artigo 476 da CLT: "Em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o empregado é considerado em licença não remunerada, durante o prazo desse benefício".  Nos termos do caput do artigo 63 da Lei nº 8.213, de 1991: “O segurado empregado, inclusive o doméstico, em gozo de auxílio-doença será considerado pela empresa e pelo empregador doméstico como licenciado”. Em sendo assim, o empregado, durante o período em que ficar afastado percebendo auxílio-doença previdenciário ou acidentário, tem a vigência de seu contrato de trabalho suspensa.
Conforme caput do artigo 60 da Lei nº 8.213/1991, o auxílio-doença será devido ao segurado empregado, e pago pela Previdência Social (INSS), a contar do 16º (décimo sexto dia) do afastamento da atividade. O § 3º do referido artigo 60 estabelece que durante os primeiros 15 (quinze) dias consecutivos ao do afastamento da atividade, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral.
Dessa forma, os primeiros 15 (quinze) dias do atestado médico serão considerados normalmente para efeito da contagem do cumprimento do contrato de experiência, ou seja, o contrato de experiência flui normalmente durante os 15 primeiros dias. Vencendo o contrato de experiência no período dos 15 dias do atestado médico, este será dado por vencido, devendo ser rescindido normalmente. Porém, se o contrato de experiência vencer após o 15º dia do afastamento, este fica suspenso, completando-se o seu cumprimento, a contar a partir do dia em que o empregado efetivamente retornar ao serviço, após a cessação do benefício previdenciário. Completados os dias contratados no contrato de experiência (90 dias, por exemplo), o contrato deverá ser rescindido normalmente.
Frisa-se, no caso do atestado médico ser inferior a 15 dias, o contrato de experiência deverá ser rescindido na data do seu vencimento.
Importante observar que se o afastamento for por motivo de acidente do trabalho, na forma definida pelos artigos 19 a 21 da Lei nº 8.213/1991, o empregado afastado tem direito à estabilidade provisória prevista no artigo 118 desta Lei, hipótese em que o contrato de trabalho do empregado passa a ser por prazo indeterminado. O artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 assim estabelece:
Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.
O Enunciado da Súmula TST nº 378 assim estabelece:
I - É constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado. (ex-OJ nº 105 da SBDI-I - inserida em 01.10.1997)
II - São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a consequente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. (primeira parte - ex-OJ nº 230 da SBDI-I - inserida em 20.06.2001).
III – O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/91.
Abraços...

domingo, 14 de julho de 2019

CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL DISPENSA CONSENTIMENTO FORMAL DO CÔNJUGE

De acordo com a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os contratos de arrendamento rural – mesmo aqueles com prazo igual ou superior a dez anos – dispensam o consentimento do cônjuge para terem validade.
A posição do colegiado foi expressa ao negar provimento a um recurso que pretendia o reconhecimento da nulidade de contrato de arrendamento rural firmado sem o consentimento do cônjuge do arrendador.
O arrendatário ajuizou ação monitória contra o espólio do proprietário da terra arrendada após ter conhecimento de que a viúva não iria mais permitir que ele continuasse o plantio, mesmo restando sete anos no contrato de arrendamento. Ele mencionou que o contrato previa multa no valor de cem sacas de soja por ano de obrigação descumprida.
A sentença julgou a ação procedente e condenou o espólio a pagar a indenização. O espólio alegou, sem sucesso em primeira e segunda instâncias, a nulidade do arrendamento, feito sem a outorga específica da esposa do arrendador, que era casada em regime de comunhão universal de bens.
No STJ, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso especial, destacou que não há exigência legal de consentimento do cônjuge para a validade do contrato de arrendamento rural, ainda que o prazo seja igual ou superior a dez anos.
O ministro destacou o dirigismo contratual presente nas relações que envolvem questões agrárias. “Tal princípio corresponde aos limites estabelecidos ao poder negocial das partes contratantes pela intervenção estatal, em nome do interesse público, tutelando a vulnerabilidade de determinados contratantes mediante a fixação de norma cogente”, explicou.
“Entretanto, não se observa, na legislação agrária, a mesma preocupação quanto à forma como requisito de validade, sendo regulado como contrato não solene, não sendo exigida forma especial”, disse ele.
Sanseverino frisou que as limitações impostas pela legislação ao contrato de arrendamento rural estão focadas nas questões de prazo, fixação de preço e direito de preferência do arrendatário.
Atos permitidos
O relator afirmou que, na ausência de norma específica, devem ser aplicadas ao caso as regras do Código Civil, que nos artigos 1.642 e 1.643 permitem que qualquer um dos cônjuges, sem a autorização do outro, não importando o regime do casamento, administrem os bens próprios com a prática de todos os atos que não forem vedados expressamente.
“Dessa forma, considerando ser o contrato de arrendamento rural um pacto não solene, desprovido de formalismo legal para sua existência, foi dispensada pelo legislador a exigência da outorga uxória do cônjuge. E isso, justamente, por se enquadrar em um dos atos que podem ser praticados sem autorização do cônjuge, qual seja, administrar os bens próprios e praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente”, resumiu Sanseverino.
Fonte: STJ - Coordenadoria de Editoria e Imprensa, publicada originalmente em 26/06/2019.
Abraços...