O artigo 944, parágrafo único, do Código Civil autoriza a redução da responsabilidade nesses casos.
Ao julgar recurso de um
trabalhador, contratado sem concurso por uma empresa pública, a 4ª Turma
do TRT/MG decidiu contrariamente à Súmula 363 do TST, manifestando o
entendimento de que os ônus decorrentes da ilegalidade do contrato
declarado nulo devem ser divididos entre as partes.
No caso, atendendo ao disposto no artigo 37, inciso II, da
Constituição Federal, a juíza de 1º Grau declarou a nulidade do contrato
entre o reclamante e a empresa pública, já que este não foi precedido
de concurso público. A sentença aplicou a Súmula 363 do TST, que
assegura ao trabalhador nessas condições apenas o salário, em relação ao
número de horas trabalhadas, e os valores referentes aos depósitos do
FGTS.
Mas essa solução não foi considerada a melhor pelo relator do
recurso, juiz convocado Cléber Lúcio de Almeida. Dando razão ao
trabalhador, ele explicou que a Constituição prevê como fundamentos da
República a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho.
Além disso, dispõe que a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária constituem objetivo da República, também estabelecendo que a
ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna. Nesse
sentido, dispõem os artigos 1º, inciso III e IV; artigo 3º, inciso I; e
artigo 170, caput, da Constituição Federal.
Mas não é só, acrescenta o magistrado: A Constituição de 1988 dá
um passo adiante, posto que assegura aos trabalhadores um rol de
direitos, aos quais reconhece, pela sua localização no texto
constitucional, a natureza de direitos fundamentais (art. 7º). Para o
relator, a análise conjunta de todos esses dispositivos permite concluir
que a Constituição assegurou direitos mínimos para que o trabalhador
tenha uma vida digna. O constituinte de 1988 elegeu, no último artigo
mencionado (7º), os direitos sem os quais não estão presentes as
condições materiais mínimas necessárias a uma vida digna para aqueles
que vivem da venda da sua força de trabalho e a construção de uma
sociedade verdadeiramente livre, justa e solidária, destacou.
E com o contrato nulo não pode ser diferente. De acordo com as
ponderações do relator, a própria Constituição (artigo 39) estendeu aos
servidores públicos vários dos direitos previstos no artigo 7º, como,
por exemplo, salário mínimo, 13º salário, adicional noturno, repouso
semanal, horas extras e férias anuais remuneradas. Isso significa que
também os que prestam serviços para a Administração Pública devem ter a
dignidade repeitada. Portanto, na avaliação do magistrado, ainda que
nulo o contrato de trabalho, o trabalhador deve receber o mínimo
necessário para uma vida digna. Este mínimo deveria ser o previsto no
artigo 7º da Constituição, na visão do julgador.
Por outro lado, assim como o ente público contratante não pode
ser beneficiado pela ilegalidade da contratação, também o trabalhador
não deve ficar isento de responsabilidade. Afinal, ninguém pode alegar
que desconhece a regra de que a Administração Pública somente pode
contratar pessoal mediante concurso público. Seguindo essa lógica, o
relator chegou a um meio termo como solução: os ônus da ilegalidade na
contratação dos serviços devem ser divididos entre as partes,
equitativamente. O magistrado explicou que ao juiz é lícito adotar, em
cada caso, a decisão que se lhe apresente mais equânime, conforme artigo
852-I da CLT. Para ele, impor apenas ao reclamante o encargo de sua
contratação irregular não é razoável. Atribuir somente ao trabalhador os
ônus da sua contratação irregular implicaria estabelecer excessiva
desproporção entre a sua culpa e os efeitos do ato praticado por ele e
pela reclamada. O artigo 944, parágrafo único, do Código Civil autoriza a
redução da responsabilidade nesses casos.
Ainda de acordo com o entendimento do relator, não reconhecer
direitos ao trabalhador seria premiar o ente público com sua própria
torpeza. Isso porque se trata de serviços lícitos a custo mínimo
(somente salários e depósito do FGTS pela Súmula 363 do TST). Como
lembrou o magistrado, se a contratação dos mesmos serviços fosse
regular, a empresa pública teria de respeitar os direitos previstos no
artigo 7º da Constituição da República.
Com base nessas considerações, o relator decidiu deferir ao
trabalhador contratado irregularmente a metade do valor correspondente
aos direitos mínimos previstos na Constituição para uma vida digna, no
que foi acompanhado pela Turma julgadora. Portanto, o trabalhador deverá
receber metade das seguintes parcelas: aviso prévio, férias com 1/3,
13º salários do período contratual não alcançado pela prescrição e ainda
o FGTS na sua integralidade acrescido de 20%, como indenização pela
dispensa.
( 0000852-46.2011.5.03.0061 ED )
Fonte: TRT-MG
Abraços...
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